Como profissional da saúde dedicada à nutrição infantil, eu percebo que, quando o assunto é alimentação na infância, a preocupação com o ganho de peso ainda domina boa parte das conversas com as famílias. No entanto, ao longo da minha trajetória, o que vejo com frequência — e que merece tanta atenção quanto — é a seletividade alimentar.
Esse comportamento, muitas vezes tratado como “frescura” ou uma “fase passageira”, pode gerar um grande impacto não apenas na saúde da criança, mas também no bem-estar da família como um todo.
Afinal, o que é seletividade alimentar?
Seletividade alimentar é quando a criança recusa muitos alimentos e limita sua alimentação a um grupo bem pequeno de itens — geralmente os mesmos todos os dias. Muitos pais me relatam: “meu filho só come arroz, frango e macarrão” ou “ela não aceita nenhuma fruta ou verdura, por mais que eu tente”.
Embora seja normal que crianças pequenas passem por fases de maior resistência, essa seletividade pode se tornar preocupante quando compromete a qualidade da alimentação e passa a interferir em momentos sociais, como comer fora, ir a festas ou participar de refeições na escola.
Por que algumas crianças se tornam tão seletivas?
Cada caso é único, mas, com o tempo, observei alguns padrões bem frequentes entre as crianças que atendo:
- Sensibilidade sensorial aumentada: muitas têm aversão a certas texturas, cheiros ou até cores. Isso é mais comum em crianças com TEA, mas não exclusivo a elas.
- Experiências negativas anteriores: episódios como engasgos, vômitos ou até momentos de pressão à mesa podem marcar a criança e gerar aversão.
- Falta de exposição variada: se o ambiente familiar tem uma dieta restrita ou pouco variada, a criança tende a repetir esse padrão.
- Ambiente de refeição tenso: quando comer vira sinônimo de briga, chantagem ou estresse, a relação com a comida se deteriora.
Quando essa seletividade deve ser motivo de preocupação?
Sempre oriento os pais a observar alguns sinais de alerta. A seletividade alimentar pode ser mais do que apenas uma preferência quando:
- A alimentação se restringe a menos de 10 ou 15 alimentos diferentes;
- A criança evita grupos inteiros como frutas, legumes ou proteínas;
- Começa a apresentar sintomas físicos, como cansaço, palidez, constipação ou dificuldade de concentração;
- O comportamento alimentar limita momentos sociais importantes;
- Os pais sentem-se esgotados emocionalmente por não conseguirem mudar esse cenário.
Se você se identificou com algum desses pontos, talvez seja o momento de buscar ajuda profissional.
Estratégias que recomendo
Não existe fórmula mágica, mas algumas abordagens têm feito grande diferença na prática clínica e na rotina das famílias que acompanho:
- Respeite o tempo da criança: evitar pressões é fundamental. Comer precisa ser uma experiência agradável, não um campo de batalha.
- Exposição frequente, sem obrigar: estudos mostram que oferecer (sem exigir) o alimento por várias vezes aumenta a chance de aceitação.
- Coma junto e com prazer: nada ensina mais do que o exemplo. Quando os pais comem bem, a criança tende a observar e, com o tempo, se interessar.
- Convide a criança para participar: ir ao mercado, ajudar na cozinha ou montar o prato são formas incríveis de envolvê-la com o alimento.
- Crie uma rotina positiva à mesa: sem distrações, com um ambiente tranquilo e sem pressa.
Como posso ajudar?
Acompanhar famílias com crianças seletivas é uma das áreas em que atuo. Meu foco não é apenas corrigir deficiências nutricionais, mas também reconstruir a relação da criança com a comida — de forma gentil, respeitosa e funcional.
Juntos, investigamos a origem da seletividade, avaliamos o estado nutricional e, com base nisso, traçamos estratégias individualizadas para cada realidade familiar. Muitas vezes, o acompanhamento multidisciplinar (com psicólogos, fonoaudiólogos e terapeutas ocupacionais) também se faz necessário — e posso orientar sobre isso.
Minha mensagem final para você, mãe, pai ou cuidador
Se você está passando por isso em casa, quero te dizer: não é culpa sua. A seletividade alimentar infantil é mais comum do que parece e, sim, existe um caminho possível — com paciência, orientação certa e muito acolhimento.
Estou aqui para caminhar com você nessa jornada. 💛
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